quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A Constitucionalidade do Exame de Ordem enquanto garantia da dignidade da profissão de advogado




Por Luciana Braga Reis*

Em votação unânime durante sessão realizada no dia 26/10/11, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 603.583/RS, tendo por Relator o Min. Marco Aurélio de Mello, decidiu pela constitucionalidade do Exame de Ordem, como requisito para o ingresso do bacharel em Direito na profissão de Advogado.

O Exame de Ordem revela-se um mecanismo de aferição de aptidão necessário para garantir aos jurisdicionados a qualidade da atuação dos profissionais, configurando-se etapa inaugural para a admissão nos quadros de Advogados da OAB.

Em sede constitucional, o legislador constituinte fez registrar expressamente no inc. XIII, do art. 5º, que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.” (Grifou-se)

À guisa de esclarecimento, a lei, no caso, é o Estatuto da OAB (lei nº 8.906/94), que impôs a exigência da qualificação do Exame de Ordem como condição de habilitação para o exercício da Advocacia, além, da indispensabilidade do diploma universitário e a comprovação de idoneidade do candidato. Em outras palavras, determina que o livre exercício da profissão está adstrito aos requisitos que a lei prevê para a inscrição como Advogado, sendo a aprovação no exame, apenas uma delas.

Noutro prisma, a Constituição Federal de 1988 em seu art. 133, já consagrou que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. (Grifou-se)

Nesse ponto, observe-se que, pela própria determinação do comando constitucional, o Advogado enquanto detentor de múnus público, as exigências impostas para o exercício da profissão devem ser mais rígidas que outras profissões. Partindo-se dessa premissa, o Exame de Ordem deve ser entendido como uma habilitação exigida por lei, sem a qual, os bacharéis em Direito e meros portadores de diploma jamais poderão exercer a advocacia, muito embora tenhamos notícia de existir burla nesse sentido.

Para se compreender a magnitude do problema, vale lembrar que, a despeito da crise do ensino jurídico e da formação acadêmica deficitária dos bacharéis, se a advocacia é função essencial à Justiça, e esta, fundamental para a garantia do Estado Democrático de Direito, afigura-se imprescindível exigir dos candidatos as competências reais mínimas para o desempenho da profissão, as quais são aferidas pelo exame da OAB.

Ora, por certo, a colação de grau no curso de Direito com a respectiva expedição do diploma não gera direito subjetivo do bacharel ao acesso imediato e automático ao exercício da advocacia.

Carece, portanto, de qualquer respaldo jurídico a malfadada tese de que o exame mitiga ou mesmo impede o “livre exercício da profissão”. Isto porque o bacharel poderá concorrer a várias carreiras de nível superior, como delegado, analista, dentre outros, além de poder ministrar aulas, o que não pode, é exercer a advocacia enquanto não submeter-se ao exame de ordem e lograr a sua aprovação.

Acresça-se a isso, que em nome da indispensabilidade da Advocacia para justiça é que proclama-se a constitucionalidade do Exame de Ordem previsto e consolidado no art. 8º, inc. IV, e parágrafo 1º, da Lei nº 8.906/94, com vistas a afastar o exercício de uma advocacia temerária, conquistada apenas pelo diploma, sem a qualificação técnica necessária exigida para tanto. Os altos índices de reprovação dos últimos exames aplicados pela OAB evidenciam essa precariedade no ensino jurídico.

Por oportuno, nas considerações pontuais do ilustre Min. Marco Aurélio, no voto do Rec. Extraordinário nº 603.583/RS, assim ponderou:

“[...] Cabe indagar: quem exerce a advocacia sem a capacidade técnica necessária, afeta outrem? A resposta é desenganadamente positiva. Causa prejuízos, à primeira vista, ao próprio cliente, fazendo-lhe perecer o direito ou deixando-lhe desguarnecido, mas também lesa a coletividade, pois denega Justiça, pressuposto da paz social. Atrapalha o bom andamento dos trabalhos judiciários, formulando pretensões equivocadas, ineptas e por vezes, inúteis. Enquanto o bom advogado contribui para a realização da Justiça, o mau advogado traz embaraços para toda a sociedade, não apenas para o cliente”.

Em outro trecho do voto, como bem sustentou o digníssimo Relator:

“[...] o Exame de Ordem serve ao propósito de avaliar se estão presentes as condições mínimas para o exercício da Advocacia almejando-se oferecer a coletividade profissionais razoavelmente capacitados. [...] Ou seja, se o exercício de determinada profissão pode provocar danos a outras pessoas além do indivíduo que a pratica, a lei pode exigir requisitos e impor condições para o seu exercício. É o caso da advocacia”.

Ponho-me inteiramente de acordo!

Ver decretada a dispensabilidade do Exame seria o mesmo que ver triunfar toda a sorte de profissionais sem preparo e qualificação adequados ao ingresso na profissão, bem como a violação de princípios constitucionais tão caros ao ordenamento jurídico pátrio, sem mencionar o flagrante desrespeito ao nosso estatuto, tudo por conta da irresignação dos “excluídos da advocacia” que alegam sentirem-se frustrados pelo impedimento do exercício profissional sem a devida habilitação.

De mais a mais, é insuscetível de dúvida que a proliferação dos cursos de Direito ocorrida no Brasil nos últimos anos sem a observância dos critérios qualitativos e imprescindível à formação do bom profissional, vem contribuindo sobremaneira para a má formação dos futuros profissionais, lançando no mercado de trabalho um sem número de bacharéis completamente despreparados, em virtude do já combalido ensino jurídico.

Em linha semelhante, ao nosso sentir, todos os cursos de nível superior deveriam aplicar uma prova técnica ou exames de proficiência com vistas a avaliar o grau de aprendizado, conhecimento e preparo dos seus candidatos para exercer a profissão. Será que a deficiência no ensino superior aliada à falta de uma fiscalização mais rígida dos cursos que apresentam baixa qualidade circunscreve-se tão somente ao concorrido curso de Direito?

A resposta é inarredavelmente negativa.

Parece-nos, contudo, que a questão refere-se ainda à credibilidade, à dignidade do papel constitucional conferido à profissão de Advogado, consubstanciando-se na existência de lei com exigências específicas, dentre elas o exame, o que não ocorre até o presente momento com outras profissões regulamentadas.

Louvável, portanto, a decisão de constitucionalidade pela exigência e manutenção do Exame de Ordem. A advocacia foi contemplada com o reconhecimento que merece, e acabar com o Exame seria prestar um verdadeiro desserviço à sociedade! Lutar por esses valores é, antes de tudo, lutar pela dignidade da profissão de Advogado!

*Advogada do Grupo Mateus, Especialista em Direito Público, com Formação para o Magistério Superior, pela Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes - LFG, em convênio com a Universidade Anhangüera – Uniderp, Tutora de TCC à distância do Curso de Especialização em Gestão Pública, do Programa Nacional de Formação em Administração Pública – PNAP, pela Universidade Estadual do Maranhão – UEMA.
 

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